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sábado, 11 de fevereiro de 2012

ENSAIO A poética do devaneio 11.02.2012



A infância é outro tema visitado, em diferentes abordagens. Em "De máscaras e desejo: infância na contística de Clarice Lispector", Élcio Luís analisa dois contos emblemáticos - "Felicidade Clandestina" e "Restos de Carnaval" - num aporte psicanalítico do desejo infantil e dos obstáculos a serem transpostos para a realização deles.
Resgates
"Clarice e a infância jamais perdida", de Fernanda Coutinho, resgata a Clarice menina, nas ruas de Recife, para intuir as páginas lidas que encantaram e viraram as palavras poéticas da escritora. São as vivências dos tempos de criança que norteiam, de acordo com a professora, a criação subsequente da escritora que enveredou pelas letras em tenra idade.
Já "Margens da alegria: a infância em 'A menor mulher do mundo'", de Sarah Diva da Silva Ipiranga, associa surpreendentemente as reações de Pequena Flor, a pigmeia minúscula que tem medo de ser devorada, ao comportamento infantil, embora já seja ela uma mulher e esteja grávida. Embora, como já se disse, os artigos não se limitem à análise das narrativas de Laços de Família, é dessa obra que surge a maioria dos artigos, cujos enredos propiciam diálogos homoautorais, o que dá unidade ao livro, pelas recorrências temáticas e ressignificações.
Dos processos
A análise do processo criador aparece à luz da Poética do devaneio, de Gaston Bachelard, em "Poética e devaneio do processo criativo de Clarice Lispector", de André Luiz Gomes e Jean Claude Miroir. Nesse esteio de análise da escritura, tem-se, ainda, "Devaneio e embriaguez duma rapariga": Clarice Lispector e a narração falsificadora", de Ilza Matias de Sousa, pesquisa embasada em teóricos como Gilles Delleuze, Maurice Blanchot, Féliz Guattari, Jacques Derrida, Michel Foucault. "A bruta flor do amor", de Lúcia Castelo Branco, com base em textos de Maurice Blanchot e Jacques Lacan, investiga os caminhos do leitor do conto "Amor" e fala sobre as contradições dos sentimentos nele existentes. Em "'Mistério em São Cristóvão' ou os mascarados e a mocinha do fio branco", de Odalice de Castro Silva, destacam-se os jogos de linguagem e esconde-esconde da autora de 'escrita insidiosa', que constantemente escamoteia a relação entre vida e Literatura.
Quatro leituras
"A menor mulher do mundo e outras mulheres nos laços narrativos de Clarice Lispector", de Ângela Fernandes de Lima" focaliza 4 contos - "A menor mulher do mundo", "Uma galinha", "Feliz aniversário" e "A imitação da rosa", mostrando a relação eu versus o outro e centrando parte da análise na figura da personagem Pequena Flor, a mais diferente das mulheres clariceanas.
Em "O teatro da crueldade e o animal - escrita na fábula da modernidade clariceana", Ilza Matias de Sousa e Maria Eliane Sousa da Silva analisam os devires, com base em Maurice Blanchot, Antonin Artraud, Gilles Delleuze e Félix Guattari. Em "Nem tanto a Ulisses nem tanto a Penélope: a sobrevivência do mito em Clarice Lispector" de Maria Aparecida Ribeiro, resgatam-se os significados dos mitos na associação entre os personagens de Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres a Ulisses e Penélope, da epopeia Ilíada, de Homero.
Múltiplos diálogos
Saindo das obras para a vida, mas perquirindo sempre a criação literária, "Essa coisa íntima que está sempre queimando em Lúcio e Clarice", de Teresa Montero, autora da biografia Eu sou uma pergunta (1999), fala sobre a amizade entre Lúcio Cardoso e Clarice Lispector, suas influências e trocas de afetos.
O diálogo da literatura com outras linguagens, por meio do texto clariceano, aparece nos artigos de Ermelinda Ma. Araújo Ferreira ("Sujos quintais com tesouros: escrita e riprografia em CL"), que investiga escrita e riparografia, fazendo a equiparação da escrita clariceana à riparografia da pintura; e no de Taciana Oliveira, "Acordes para um roteiro", que disserta sobre o filme "A descoberta do Mundo", dela em parceria da cineasta com Teresa Montero, biógrafa de Clarice; a proposta é, no filme, tecer o diálogo da obra com a autora. Já "Clarice por trás da objetiva" é uma resenha sobre o livro Clarice fotobiografia, de Nádia Gotlib, feita por Ricardo Iannace, acerca da cronologia de fotos publicadas no volume.
Considerações finais
É interessante, também, ler crítica sobre a crítica, - "O leitor sitiado e a renovada experiência da leitura: uma crítica que se conta", de Diana Junkes Martha Toneto, faz uma leitura crítica do livro Clarice: uma vida que se conta, de Nádia Gotlib. Por último, sabe-se acerca do catálogo da coleção Clarice Lispector do Instituto Moreira Sales, bem exposto por Fábio Frohwein, com o inventário de todos os arquivos, correspondências, documentos sonoros, pinturas, fotografias e obras. Clarices: uma homenagem é um marco na fortuna crítica da obra de Clarice Lispector e se afirma, desde seu lançamento, como um livro fundamental acerca da diversidade e complexidade do texto clariceano bem como de sua vida mitificada e ilusoriamente compreensível por meio dos seus escritos.

SAIBA MAIS
BLOOM, Harold. Cabala e crítica. Rio de Janeiro: Imago, 1991
MORAES, Alexandre. (Org.) Clarice Lispector em muitos olhares Espírito Santo: UFES, 2000
MOSER, Benjamin. Clarice, uma biograifia. São Paulo: Cosac Naify, 2009
NUNES, Benedito. O drama da linguagem: uma leitura de Clarice Lispector. São Paulo: Ática, 1989
SANTOS, Roberto Corrêa dos. Lendo Clarice Lispector. Rio de Janeiro: Atual, 1986

Fonte: http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=1103705

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