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segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Rosa de Ouro






Quando a noite chega 
ela vai se guardar...
Dorme como um anjo 
a espera do luar...
Um novo dia vai surgir
com o sol a brilhar...
E, logo despontará no jardim
a sua rosa de ouro


segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Salsa




E' in ogni movimento, 
che si balla con l'anima 
e arriva al'apogeu.
É bisogno un spirito d'angelo
con forza e coraggio 
per vencere tutti gli sfide.
Il cuore e' una parte sensibile 
ma al stesso tempo troppo forte 
Fa la vita sentire ogni volta
mai piena di sogni, 
perché la salsa e' passione 
per chi ama la vita. 

Margleice Pimenta, 24/10/11

quinta-feira, 20 de outubro de 2011


Lançamento "Sem Peúgas nem Borzeguins: crônicas para o entardecer", de Lustosa da Costa (21.10)


Convido a todos de Fortaleza e proximidades, para esse grande lançamentos de 

 Peúgas nem Borzeguins: crônicas para o entardecer", de Lustosa da Costa



Sem Peúgas nem Borzeguins:
crônicas para o entardecer
(Expressão Gráfica e Editora)
de Lustosa da Costa

Data: 21 de outubro de 2011 (sexta-feira)
Horário: a partir das 17h (para recepção de amigos e sessão de autógrafos)
Local: Centro Cultural OBOÉ (rua Maria Tomásia, 531, Aldeota – ao lado do shopping Aldeota Open Mall – fone: 3264.7038)
Para contato com o Autor: sobralense@uol.com.br

Crítica sobre a obra de Lustosa da Costa:

“Começa-se toda a viagem de leitura do Sem Peúgas nem Borzeguins: crônicas para o entardecer em um avião. Lustosa chegava a Lisboa para participar, em maio de 2006, nos jardins da residência do, na época, embaixador Paes de Andrade, com a presença de Dário Castro Alves, do presidente português Mário Soares, do diplomata José Carlos Araújo Leitão e do presidente de honra do Partido Socialista, Almeida Santos.” (Raymundo Netto)

“Discípulo de Milton Dias, de Moreira Campos, ou de Mário Lago, Chico Anísio e alguns outros excelentes ‘causeurs’, Lustosa se aprimora em seu estilo chistoso, mantendo o interesse do leitor numa constante. Mesmo quando procura ser mordaz, ferino ou homem mau, não chega a amedrontar ninguém. Pelo contrário, percebe-se que inexiste maldade em sua alma, que diz aquilo sem querer ofender, por mero espírito brincalhão.” (Blanchard Girão, jornalista)

“Li e gostei imensamente. Os elementos irônicos, cômicos e trágicos misturam-se num mélangetocante e simpático. É de um fatalismo desses que a gente tem vontade de quebrar, de reescrever de tanto o envolvimento com o que está se passando ‘na tela’”. (Malcolm Silverman, da Universidade do Estado da Califórnia)

“(...) agradou-me muito o estilo na fronteira entre jornalismo e ficção, a forma solta e enxuta do texto. Estou gostando muito, o texto agarra bem, tem tudo de bom que o jornalismo pode ensinar a um prosador. A história contada em flashs é muito visual e atraente”. (Mia Couto, escritor moçambicano)

“Lustosa entra, com a maior dignidade, na vasta galeria dos melhores contadores de estórias do país. Chego à última página do livro e não consigo afastar de minhas retinas fatigadas (acho que isso é do poeta Drummond) da imagem patética do protagonistaEtelvino Soares, pobre de carnes e rico de ideias mirabolantes, marchando ‘ao encontro da morte pelas ruas lamacentas, as abas do fraque abertas ao vento como velas enfunadas’. E isso me deixa comovido como o diabo (ainda o poeta Drummond)”. (Francisco Carvalho, poeta)

“O livro desenvolve-se num estilo muito ‘popular’. Alguns episódios desta cidade (Sobral) chegam até ser muito engraçados deleitando o leitor. É um livro que enriquece e enobrece, ensina sobre os costumes e as expressões do lugar”. (Jean-Pierrre Barakat, da Grécia)

(*) Trechos de correspondência com autores, jornalistas e críticos sobre obras publicadas de Lustosa da Costa

Biografia Breve: Lustosa da Costa, jornalista e escritor, nasceu na Paraíba (1938), mas, desde 1942, criou-se em Sobral, Ceará. Com apenas 9 anos, já assinava o seu pequeno “Diário” de repórter político. Publicou seu primeiro artigo no Correio da Semana, de Sobral. Em 1966, foi o candidato a deputado federal (MDB) mais votado no Estado. Trabalhou como repórter e/ou editor em Unitário, Correio do CearáO Estado de S. PauloJornal da Tarde eCorreio Braziliense; publicou o Anuário do Ceará(com Dorian Sampaio) e é autor de cerca de 27 títulos publicados (diversos gêneros), alguns deles em Portugal, França e África; participou de diversas antologias e recebeu prêmios. É membro da Academia Brasiliense de Letras e, atualmente, colunista político do Diário do Nordeste.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

As molduras ficcionais de Lourdinha Leite Barbosa





PELA MOLDURA DA JANELA & outras histórias, segundo livro de contos de Lourdinha Leite Barbosa, traz 22 histórias distribuídas em três blocos: “A vez delas”, onde temos narrativas que focalizam nuances de personagens femininas; “A vez deles”, que abre espaço ao universo masculino, e “Dois pra lá dois pra cá”, com quatro contos que, dois a dois, contam e recontam o mesmo enredo por meio de pontos de vista diferentes.

Suas narrativas são concisas, sua linguagem é simples, mas velada em símbolos que puxam a atenção do leitor. Por que o mundo perde as cores para a protagonista do conto “Pela moldura da janela”? Por que as borboletas da capa da agenda ‘voltam a voar’ quando a menina passa a utilizá-la, após a morte da avó? Por que o segundo lote de vinho servido é melhor que o primeiro (em “Casamento no Campo”)? Qual dos irmãos fala a verdade (“Costurando a trama” e “Descosturando a trama”). Pequenas inquietações se formam com as provocações daquilo que é menos dito e mais sugerido.

Sua matéria é o cotidiano em desordem: o amor que finda, a velhice, a morte, os desencontros, as limitações humanas, o ciúme, a traição, a vingança, a loucura, a cidade e suas tramas. Nada, entretanto, imprime pessimismo à sua escritura denunciadora dos desequilíbrios, ao contrário, há sempre a possibilidade de renascimento e renovação, como ela bem simboliza na figura das borboletas azuis, desenhos na capa de uma agenda, que parecem ganhar vida na imaginação do leitor.

O título do livro – 
Pela moldura da janela – também título do conto que abre a coletânea, ratifica o que diz a psicanalista e professora Laéria Fontenele no Prefácio: “Os contos de Lourdinha Leite Barbosa aproximam-se de um quadro”. De fato, são cenas emolduradas, recortes de instantes que ganham vida na sua criação prodigiosa. Os personagens não têm passado nem futuro, só o momento fisgado pela ficção.

Enquanto a falta de amor tira as cores da vida de uma recém-separada (“Pela moldura da janela”), as desconfianças de traição (“Pontos e nós”) não se confirmam nas investigações de uma mulher que vive uma relação duradoura. A velhice que chama a morte (“As borboletas azuis”) renova a dimensão humana na criança que parece dar continuidade aos passos da avó que se foi serenamente. A morte de uma irmã é o recomeço da vida da outra (“Sonata para violino em três vozes”).

A urbanidade sufocante desorganiza o equilíbrio da mulher, e a ficção o transfigura em fantástico. Sim, na subversão do real, sem alegoria entretanto, a mudança da paisagem com a construção de um prédio ao lado do que mora a protagonista desencadeia o insólito em “...Mas que los hay, los hay”. Entre a realidade e o delírio, ela sente a invasão do seu espaço, a perda da privacidade com a presença de pedreiros muito próximos à sua janela. A sensação de emparedamento na selva urbana a faz transpor o real e misturá-lo ao sonho que vira pesadelo e é, ao mesmo tempo, delírio: “Acordou de madrugada com a sensação de estar num navio à deriva. Num impulso sentou-se na cama e não acreditou em seus próprios olhos: o esqueleto de tijolos estava colado à janela do seu quarto, emparedando-a. Desesperada, acendeu a luz e viu o apartamento ser tomado por um bando de morcegos com caras humanas que voavam numa enorme algazarra. [...] Pela manhã ela foi encontrada com um relógio de pulseira preta puída na mão, repetindo sem cessar “Como morcegos, ao cair das badaladas, / saltam de viga em viga os mestres carpinteiros”” (p.38-39).

O mal-estar sartreano desse conto dá à ficção de Lourdinha uma dimensão existencialista, que se afirma prodigiosamente em “Quadros em movimento”, onde o gênero fantástico se realiza com perfeição. Uma moça, Ingrid, recém-chegada de viagem, “com a mala quase vazia, mas a mente repleta”, acrescenta mais um quadro na parede do seu apartamento. Ouvindo distraidamente Chico Buarque, ela não percebe que as figuras dos quadros ganharam vida e estão desertando das telas... desaprisionadas, conversam entre si e denunciam o momento em que foram detidas pelas tintas de algum pintor. Embora demonstre atordoamento, não há racionalização do insólito por um provável delírio da personagem, provocado pelo cansaço: “Durante a confusão, uma moldura caiu. Ingrid levantou-se atordoada. Estava mesmo precisando descansar, suas pernas pareciam não lhe pertencer. Apanhou o quadro e, ao colocá-lo de volta, parou perplexa: sua parede estava coberta de molduras, cujas telas não tinham um vestígio sequer de tinta” (p.45). O inexplicável aconteceu, e a prova são as telas brancas, abandonadas por suas imagens.

Já em “Casamento no Campo”, a sugestão do milagre ‘da multiplicação dos pães’ e da transformação da água em vinho traz uma intertextualidade com a Bíblia Sagrada, mas sem qualquer conotação religiosa. A mãe exige a presença do filho em uma festa de casamento dos vizinhos, cuja cerimônia simples já havia sido muito adiada em função das dificuldades financeiras. Cedo, o vinho acaba, e Maria (a mãe), vendo os amigos angustiados, pede a interferência do filho, que logo passa a encher as garrafas na torneira e... qual a surpresa: todos dizem que o segundo vinho servido é bem melhor que o primeiro que circulara. A possibilidade do milagre toma consistência em dois símbolos que sugerem ser Jesus Cristo o rapaz: o nome de sua mãe é Maria, e o pai é marceneiro. As sutilezas das descrições, entretanto, não permitem constatações, e a história flui no discurso da incerteza.

Em “Tentando acertar o passo”, é a solidão que leva a mulher ao mundo virtual e à busca de um amor por meio de chats de relacionamento. As características do mundo contemporâneo se desenham, enredadas nos sentimentos de desconforto com a existência: a solidão que leva a mulher a buscar amor de forma insegura (“Tentando acertar o passo”) no jogo da vida; a insegurança num casamento de muitos anos (“Pontos e nós”), que faz a esposa vasculhar os originais do romance do marido-escritor para encontrar-se no enredo e comprovar se está sendo traída, numa confusão evidente entre a ficção e a realidade; as limitações em função de problemas de saúde, que levam a personagem a mutilar os livros para poder lê-los, já que não pode mais sustentar o peso deles nas mãos.

Com já dissemos, nenhum problema culmina na ausência de soluções ou de pessimismo: a moça que procura amor no mundo virtual se decepciona, mas não desiste de sua busca; a esposa ciumenta descobre que o amor do marido por ela se renova por meio da criação; a leitora que não suporta o peso dos livros e vive a dilacerá-los procura montar uma clínica de recuperação de livros. Em outra perspectiva, a limitação aparece no conto “Um copo que cai”, quando uma criança sobre numa cadeira para pegar um copo na prateleira alta e sem chora ao vê-lo despencar-se de suas mãos, enquanto ouvia as recomendações da mãe.

Já no conto “Raios de sol”, que tem como personagens duas jovens estudantes, o ciúme se configura de modo nocivo, pois uma delas, com inveja do cabelo loiro da outra, por quem seu paquera é apaixonado, convida-a para dormir em sua casa e corta os seus cabelos (dela) durante a noite. O símbolo da força ligada ao cabelo retoma a história de Sanção, que perde os poderes quando Dalila corta-lhe as longas madeiras. No conto, sem os louros cachos, a moça perde o poder de sedução.

Em “Sonata para violino em três vozes”, a história se dá em dois momentos: Inicialmente, no ‘Primeiro andamento: lento’, se descreve o casamento feliz de Melina e sua gravidez até a sua morte durante o parto. No ‘Segundo andamento: ligeiro’, a desolação do viúvo logo passa com a dedicação das cunhadas ao bebê. A mais nova delas, Marissol, deixou seu violino na casa dos pais e passou a viver em função da criança, na casa do cunhado. Finalmente, acaba por casar-se com ele e tornar-se mãe da criança órfã de quem é tia. Em nenhuma descrição do conto esse fato se realiza, a não ser na sugestão final: “Ninguém se surpreendeu quando, um ano e meio depois, Artur atravessou a cidade com o velho violino de Marissol debaixo do braço” (p.64). São nuanças assim, sutis mas sorrateiras, para enredar o leitor atento, que dão consistência ao projeto estético das narrativas da escritora e marcam seu estilo enxuto e sugestivo.

Rompendo qualquer rótulo de escrita feminina, Lourdinha mergulha no universo masculino e dá foco às vivências deles. Situações do nosso tempo também avultam como leitmotiv: o intercâmbio do jovem que, fora do país, desenvolve uma síndrome de perseguição (Planejar pra quê?); o menino-leitor de revistas em quadrinho que se transforma em escritor (“Entre imagens e letras”); o menino que tinha obsessão por pés e se torna um fetichista maníaco (“Sapatos, pra que te quero?”); o marido que se vê incapaz de desvendar a alma da mulher amada (além das aparências”); a criança que não aceita a ausência do pai e passa a vê-lo num mendigo de rua (“A voz do silêncio”). Há, nos contos, desvendamentos e avessos, patologias repentinas, densidade psicológica. Os subtextos parecem saltar aos olhos do leitor.

A passagem inexorável do tempo e as transformações que ocorrem nas pessoas é marca dessa ficção que tem o humano como cerne, senão vejamos: a agenda da avó morta vira herança da neta, marcando a continuação da vida (“As borboletas azuis”); com o tempo, o viúvo resolve retomar a vida com a irmã da esposa falecida, renovando-se por meio do filho e do novo afeto (“Sonata para violino em três vozes”); o menino pobre, leitor de revistinhas rasgadas, que se acostumara a continuar as histórias com sua imaginação e contá-las aos amigos “com a magia e o deslumbramento provocados pela palavra” (p. 85), torna-se, na fase adulta, um escritor de revistas e vê no filho a sua mesma antiga paixão, só que, na vez dele, os personagens já não são pessoas comuns do mundo em que ele vivia, mas heróis parecidos com robôs (“Entre imagens e letras”), o que revela, mais uma vez o traço contemporâneo dos elementos ficcionais da escritora.

Outra história que parece emergir do passado é “Sapatos pra que te quero”, onde a narradora recorda um amigo que era esteta de pés femininos e toma conhecimento de que, depois de adulto, o fetiche continuou e tornou-se incontrolável, chegando a criar problemas do rapaz com a polícia.

Já em “A voz do silêncio”, um grupo de amigos, que foram jovens nos anos 60, fazem uma festa para promover o reencontro... recordam nomes, atualizam destinos, respiram ao som da Bossa Nova: “A emoção do reencontro foi, aos poucos, suspendendo o presente e trazendo de volta o passado. Eram os jovens da década de 60 que retornavam, irmanados, ao tempo da bossa nova: “Vai minha tristeza e diz a ela que sem ela não pode ser”. Alguns cantavam, outros tinham a palavra cortada antes mesmo de proferi-la, mas ninguém se importava” (p. 118). As rememorações discorrem quase sempre por meio de trechos de letras de música de Tom Jobim, João Gilberto e Vinícius de Morais, num poético exercício de intertextualidade.

Um conto se destaca especialmente pela aparência com fatos reais ocorridos no universo literário: “O envelope amarelo pardo”, em que se conta a última ida de um escritor aos Correios, para postar livros aos amigos; quando chegaram ao destino e foi lida a dedicatória, os amigos já sabiam que, na volta para sua casa, o escritor havia sido atropelado e morto. As dedicatórias figuram como uma despedida. Pelo teor da história e seus desdobramentos, bem como pela descrição do personagem-escritor, Lourdinha parece homenagear o poeta José Alcides Pinto, que foi atropelado quando retornava dos Correios onde foi postar seus novos livros aos amigos que moravam fora da cidade. Não há, porém, nenhum elemento intratextual que marque essa certeza.
A última parte, “Dois pra lá dois pra cá”, a expressão que é verso de bolero já denota um compasso marcado pelo número quatro. De fato, são quatro contos que, dois a dois, contam e recontam a mesma história por meio de pontos de vista diferentes. – A verdade tem suas versões.

No primeiro par, temos o relato de dois irmãos que se tornam inimigos. Em “Costurando a trama”, um deles, o que foi traído, assume a narração para justificar por que fez a ‘mandinga’ para o outro ficar impotente (porém com a tentação do desejo): teve a sua mulher seduzida por ele. O relato se inicia como uma resposta negativa a um pedido da mãe de que retirasse a bruxaria feita. O discurso é pontilhado por clichês reinventados e bem contextualizados (“Tenho comido o pão que o João amassou; agora é tarde”, “o cão já mordeu a língua”; “quem mandou pegar no pote se a rodilha era alheia”) e intertextualiza a grande contenda bíblica entre Caim e Abel, o que fica patente a partir do nome dos dois personagens, embora o narrador chame atenção para que seja diferente, como se quisesse fugir da sina de irmãos predestinados a serem inimigos: “Meu nome é Ariel, mas qualquer semelhança com Abel é mera sonoridade” (p.125).

Em “Descosturando a trama”, o irmão ‘traidor’ conta como se apaixonou por Elisa, antes de ela engravidar e se casar com Ariel, de o quanto resistiu à tentação de envolver-se com ela; descreve os comentários sobre os maus tratos do irmão com a mulher e, finalmente, assume o delito: “Diz o ditado que quem puder fuja da paixão; nós não conseguimos. Durante um longo tempo, permanecemos no olho do furacão. Cponsumidos pelo fogo, descemos ao inferno e subimos ao céu. O tempo apagou o escândalo, e amadureceu as chamas” (p.131).

Já em “(Des)conto I” e “(Des)conto II” tem-se o mesmo início, mas desdobramentos diferentes para o mesmo crime, como no próprio relato se afigura, à moda Pedro Salgueiro, que no livro
Brincar com Armas, utiliza magistralmente essa técnica.

Lourdinha Leite Barbosa, embora professora de Teoria da Literatura, não se trai ao utilizar teorias. Ela sabe modular seus conhecimentos técnicos e não permite que sua inventividade se submeta a eles. Brinca com as palavras, experimenta gêneros, cria imagens inusitadas, dialoga com suas leituras e cria telas com palavras sempre emolduradas por seu senso estético e sua sensibilidade. 
Pela moldura da Janela afirma, pois, seu talento e inventividade em transfigurar o jogo da vida em jogo de palavras, arte que desenvolve sem esforço, com segurança e domínio estilístico.

Aíla Sampaio

Fonte: http://litebrasil.blogspot.com/2011/10/as-molduras-ficcionais-de-lourdinha.html

terça-feira, 27 de setembro de 2011






Alguns sentimentos são tão plenos de serenidade, tão consistentes e lúcidos, que independem das podas e das regas a que a vida os submete. Estão além das belas representações e das frases de efeito, até das atitudes que sempre revelam a verdade mais que as palavras. Transcendem as incertezas e as inseguranças; driblam altivos as tempestades e as armações do destino por vezes caprichoso e traiçoeiro. Atravessam o pântano das inseguranças e dos enganos sem o desgaste do tempo e dos desastres inevitáveis da maldade e das mentiras. 

As feridas que a dor cava em sua epiderme nunca são profundas a ponto de não cicatrizarem... viram escudos, bandeiras de liberdade e confiança. Todo amor que sobrevive aos naufrágios e às emboscadas do fado implacável faz da sede e dos arranhões paredes sólidas para protegê-lo dos vendavais. Ergue-se soberano, acima do bem e do mal, multiplicando-se sempre, como flores do mato e plantas do deserto, sempre frescas e serenas, apesar da falta de cuidados.




sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Festa matutina







O dia chegando cheio de festa
com o canto do galo, dos pássaros,
é sempre uma harmonia inconfundível.

A lua dando o seu adeus matutino 
para ceder espaço para o seu grande 
irmão-amante SOL, com os seus raios
brilhantes para completar o espetáculo
.




Margleice Pimenta

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Pôr do sol

Foto by: Milene 04/09/11 

   O pôr do sol que brilha intensamente no espelho d'água. 
A noite serena que vai chegando calmamente,
tendo um caminho longo a percorrer por uma estrada deserta. 

Margleice Pimenta 05/09/11





domingo, 28 de agosto de 2011


Ensaio da amiga e professora Aíla Sampaio publicado em 14/08/11 no caderno CULTURA do Diário do Nordeste sobre a narrativa no Ceará. Em destaque são os escritores Jeff Peixoto, Inez Figueredo e Jesus Irajacy



Parte 1ª - A prosa: a deusa que nos encanta



PARTE 2ª - Heterogeneidade enunciativa e ousadia



http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=1024975


Parte 3ª - Aventura da palavra


http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=1024978

domingo, 7 de agosto de 2011

Lançamento do livro- "Pela Moldura da Janela"

Convido a todos que esteja em Fortaleza para o lançamento do livro-  "Pela Moldura da Janelada professora e escritora Lourdinha Leite Barbosa .

 Data: 22 de setembro, quinta-feira
Hora: 19 h 30min.  

Local : Ideal Clube 
Av. Monsenhor Tabosa,  1381 - Meireles
Fortaleza, Brazil

 Atenciosamente,
 Margleice Pimenta




sábado, 23 de julho de 2011

Ensaio da amiga Aíla Sampaio para o Caderno CULTURA, do Diário do Nordeste no dia 17/07/11,  sobre a Antologia "O cravo roxo do diabo"": o conto fantástico no Ceará. Recentemente lançado em Fortaleza. 

 ENSAIO
A fantástica literatura do Ceará

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Recentemente, foi lançada em Fortaleza a Antologia "O cravo roxo do diabo": o conto fantástico no Ceará, organizada pelo escritor Pedro Salgueiro. A pesquisa durou três anos e resultou num rico acervo do gênero, revelando a prodigiosa criação dos escritores cearenses desde o século XIX, quando vieram a público as primeiras publicações de textos literários em nosso estado
A Antologia "O cravo roxo do diabo": o conto fantástico no Ceará é a primeira coletânea de contos fantásticos produzidos na terra de Alencar.

A ideia inicial era traçar apenas um panorama do conto, mas a pesquisa avultou-se e decidiu-se, além dos 172 contos selecionados, inserir dois apêndices, com 17 capítulos de romances e 60 poemas, compondo, assim, um panorama amplo do texto fantástico cearense produzido entre os séculos XIX e o XXI.

O volume da pesquisa fez necessária a participação de outros três nomes da nossa literatura: Sânzio de Azevedo, Alves de Aquino (Poeta de Meia Tigela) e Carlos Roberto Vasconcelos, o que resultou num livro de 674 páginas, cujo título foi tomado de empréstimo de um conto de Álvaro Martins, infelizmente não localizado pelos pesquisadores. A bela capa criada pelo escritor Raymundo Neto, bem como o trabalho gráfico da Expressão dão ao vultoso acervo o aspecto de obra definitiva. A istematização dos cânones do Fantástico passou por muitas revisões. A mais tradicional, de Todorov, no livro Introdução à literatura fantástica, assevera que ele se alicerça por meio da hesitação do leitor em ´aceitar´ ou não os fenômenos narrados, desde que tais fenômenos não predisponham uma leitura alegórica nem poética.

O enquadramento
O crítico estruturalista opõe, ainda, o que ele chama fantástico a outros dois conceitos fronteiriços: o estranho ou o maravilhoso; o fantástico ocupa o tempo da incerteza, da vacilação entre aceitar ou não o evento extranatural; assim que se escolhe uma resposta ou outra, o fantástico é abandonado e entra-se no domínio de um dos gêneros vizinhos: o estranho ou o maravilhoso. Nessa acepção, nem todos os textos aqui coletados estariam inseridos no gênero.

Tomando, entretanto, a concepção mais atual, de Ana María Barrenechea, que afirma a configuração do fenômeno em forma de problemas feitos a-normais, a-naturais ou irreales em contraste com factos reais, normais ou naturais, considera-se fantástico todo texto cujo enredo encene acontecimentos que transponham as leis naturais, ou seja, que coloquem em conflito o mundo empírico e o mundo fantasioso.

A Antologia
Na primeira parte da antologia, dedicada aos contos, constam 172 narrativas organizadas em ordem cronológica do ano de nascimento dos seus autores, tal como ocorre nos dois Apêndices. Todos os textos, embora focalizem o extranatural por procedimentos estéticos diferentes, inserem-se no que se denomina, hoje, literatura fantástica, numa acepção ampla do gênero, tomando-o, pois, como narrativas de mistérios que confrontam o racional e o irracional.

No Ceará, o primeiro conto fantástico de que se tem registro foi escrito por Juvenal Galeno. "Senhor das Caças" tem a mesma estrutura das narrativas de Álvares de Azevedo em Noite na Taverna: enquanto trabalham com a mandioca, num serão na farinhada, os sertanejos contam histórias de caiporas, aventuras de caçadas e encantamentos. São histórias dentro de uma história. Igual estrutura está no conto "Capitão Maciel, 3.ª companhia", de Tomás Lopes, cujo enredo deixa claros seus desdobramentos: "Depois do jantar, na salinha do café, falava-se de casos estranhos, mistérios do além-túmulo. Cada um contava a sua história, todos, porém, afetando descrença, ceticismo, explicando tudo pela coincidência", numa tentativa de racionalização que não impede o espanto quando se constata a aparição de um morto, motivo também presente em Cruz Filho ("A basílica"), cujo enredo comprova a presença da ex-escrava nas ruínas da igreja onde morreu. Florival Seraine, igualmente, em seu "Guajará", coloca o insólito em contação de ´causos´ numa venda.

O realismo cearense foi prodigioso no espírito inventivo das narrativas fantásticas do início do século XIX. Duas representações significativas estão nas narrativas de Pápi Jr. ("A cruz-das-malvas") e Oliveira Paiva ("O ar do vento, Ave-Maria"). No enredo do primeiro, há uma atmosfera propícia para o sobrenatural, na descrição esmerada da escuridão da noite impenetrável e compacta, corria-nos pela frente como um largo pano sujo de fuligem, em que aparece, na estrada, em frente à cruz-das-malvas, o fantasma da pessoa que lá foi enterrada. Na do segundo, a aparição de um monstro, no meio da noite, carregando a cabeça de uma mulher (fazendo, ainda, umas caretas horrorosas) para enterrar.

E vários motivos dão asas à criação do conto fantástico cearense, como as peripécias do capeta ("O dia aziago", Lopes Filho), aparição de almas penadas ("Alma penada", de Américo Facó), espectros ("Espectros", Gustavo Barroso), visagens ("Junho é um mês que não tem fim", de Batista de Lima). Histórias de pescador com aparição de sereias ("Sereias", Herman Lima) ou botijas ("Uma história fantástica", Martins d´Alvarez; "A botija", Genoíno Sales e "A botija", Lustosa da Costa).

Outras faces
Algumas vezes, não se configura nenhum fenômeno, tão somente a atmosfera de mistério estabelece a presença do extranatural ou seu prenúncio, como ocorre no conto "Casas mal-assombradas" de, Carlyle Martins (Numa visão macabra e sinistra, atestando a transitoriedade de uma vida de opulência e conforto, a velha casa, como que indiferente ao perpassar dos anos, ensombrada pelas mongubeiras sempre monótonas e sussurrantes, tinha as paredes carcomidas e cobertas de fendas./.../

Por seu aspecto aterrador, atestava ela a glória do passado distante, obscurecido pelas brumas dos tempos e demonstrando como a felicidade humana é incerta e passageira...) e em "A Oiticica", de Otávio Lobo (Se alguém, rompendo o escuro, passa debaixo de alguma oiticica, sente arrepios de medo, pavor de visagens e, ainda, assombrações de almas do outro mundo).

Fique por dentro A gênese do discurso
O gênero fantástico tem suas raízes nas histórias de deuses, fadas e feiticeiras da Antiguidade Clássica, mas se consolidou como estética a partir do Romantismo, com suas narrativas góticas. Como todo gênero, o Fantástico teve estabelecidos os seus cânones, continuamente fundamentados e revisados por teóricos como Roger Callois, Tzvetan Todorov, Irene Bessiérre, Louis Vax, Victor Bravo, Filipe Furtado, e, mais adiante, a filóloga argentina Ana María Barrenechea, entre outros. Mestres do Horror, como H.P. Lovercraft, E. T. A. Hoffman, Edgar Allan Poe e Teophile Gautier deixaram um legado para os amantes do sobrenatural e exerceram influências na ficção fantástica produzida em todo o mundo.

AÍLA SAMPAIOCOLABORADORA*
* Professora da Unifor; poetisa e ensaísta, autora do livro Os fantásticos Mistérios de Lygia (2009)

ENSAIO

Aspectos de uma engenhosa escritura

Publicado em 17 de julho de 2011

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São bastante prodigiosos os engenhos dos nossos contistas, seja a dar vida a uma bailarina de bronze, num delírio ("A cigana", de Pimentel Soares); a configurar um milagre de um padre que salva, com sua atitude, um jovem médico da fúria de fanáticos religiosos ("Milagre" - Fran Martins), seja a atribuir a concretização de um fato insólito à fé em Nossa Senhora, como o faz João Clímaco Bezerra ("História do mar"), ou, então, a fazer sorrir um macabro boneco de Judas ("Judas", Edigar de Alencar).

Entre muitos dos textos modernos, permanecem os temas tradicionais, como a metamorfose e a morte: no conto "Pedra encantada", de Raquel de Queiroz, A história é que toda véspera de Ano-Bom ao bater da meia-noite a pedra se desencanta... molda-se a mulher toda na pedra mole como o barro no torno do oleiro. /.../ E por fim. Exausto, dorme, e quando o dia amanhece ele acorda à beira da água, junto às moitas de muçambê, e vê a pedra escura ao seu lado, e tudo lhe diz que as suas lembranças foram um sonho. Já na narrativa "O 10 nos limites do Bené Gavião", de Barros Pinho, "O Bené pulou este batente e saiu daqui com uma cabeça de onça, o corpo de homem e asas de gavião encantado".

Elementos temáticos
A morte toma forma humana em "Dizem que os cães veem coisas", de Moreira Campos, que a personifica na figura de uma mulher, antiguíssima, atual e eterna, para levar a vida de uma criança que se afoga na piscina enquanto os pais divertem-se numa festa. Do mesmo modo, no romance A Casa, de Natércia Campos, além da antropomorfização da casa, que é a narradora-testemunha de muitas histórias que se passaram sob o seu teto, a morte também assume a forma de uma pessoa que surge inusitadamente quando ocorre um suicídio por enforcamento em um dos quartos. No conto "O encanto recidivo", de Giselda Medeiros, os mortos dançam e pensam; nos enredos criados em "A capa de chuva", de Sânzio de Azevedo e em "As almas do rio perdido", de Lucineide Souto), pode-se perfeitamente conversar com pessoas mortas; em "Terror", de Glória Martins, bonecas adquirem vida, riem pavorosamente e cometem crimes.

Mistérios do além
No conto "O Homem de Neandertal" de Rubens de Azevedo, não há fronteira entre o presente e o passado; o narrador tenta proteger um amigo arqueólogo de um atentado fatal, mas não consegue: " não sonho. Parece que penetro numa fenda do tempo e participo realmente daquela vida primitiva". O arqueólogo, mesmo trancado no quarto do amigo que o vigia pelo lado de fora, é assassinado, durante a noite, por um homem das cavernas que já foi seu objeto de estudo e já vinha, há muito, ameaçando tirar-lhe a vida. Já Raimundo Batista Aragão instaura o sobrenatural na figura de uma alma penada que aparece na estrada para pedir ajuda aos incautos. Diz o narrador de "O assobiador do Folha Larga": "sexta-feira, 13 de agosto e noite de lua cheia. Como reforço às possibilidades de encontro com os mistérios do além, havia e bastante comentado, o "Assobiador do Folha Larga" cuja figura era tida como infalível. /.../ Corcunda, rosto coberto, pernas alongadas e a imitar com perfeição as pernas de um alicate. Fez-me lembrar de relance a fealdade do Corcunda de Notre Dame. Conduzia no dorso certo fardo volumoso, talvez pesado e sobretudo incômodo, uma vez que o soprar constante demonstrava cansaço. Aproximou-se ainda mais, do local onde eu me encontrava e deu o ar da costumeira e civilizada educação", tratava-se, na verdade, de um filho que há tempos assassinara o pai e ficara a vagar, carregando um peso nas costas, qual Sísifo castigado, inexoravelmente, por Zeus.

As transposições
No conto "Quadros em movimento", de Lourdinha Leite Barbosa, ´os personagens´ dos quadros afixados na parede do apartamento da narradora libertam-se e saem, como em rebelião, cada um contando a sua história de aprisionamento nas telas; quando o leitor tende a racionalizar o acontecimento, atribuindo-o a um delírio da narradora que se confessa extremamente cansada, eis que ela desperta com a queda de um quadro e percebe que a tela está completamente branca, sem vestígio de tinta.

Já no conto de Rosemberg Cariri, ocorre uma situação inversa: um homem adentra uma tela e, logo que se integra à paisagem, numa sensação de bem-estar, descobre a presença de um leão feroz. No enredo de "Escadaria", de Mônica Silveira, a personagem entra no cenário de um desenho, depois retorna à realidade, como se o insólito fosse natural. No "O leopardo da galeria Pedro Jorge", de Aldir Brasil, o narrador inicia o conto declarando "Escapou do Bom Jardim depois do sumiço da mãe e instalou-se para sempre nas paredes da cidade, feito colagem barata"; após inusitadas situações, o personagem desaparece sem que saibamos se era realmente homem ou bicho. Em "A última obra", de Isa Magalhães, é a leitora que entra na obra que está lendo, fundindo, assim, realidade e ficção.

Múltiplos caminhos
A técnica da tentativa de racionalização do evento fantástico, de que falamos há pouco, própria do escritor consciente dos cânones do gênero, está também presente na narrativa "Tugúrio", de Carlos Vazconcelos; quando o leitor pensa que tudo o que o personagem viveu foi apenas um pesadelo, o narrador o arrebata com a informação: (Texto I)

No universo fantástico, tudo é perfeitamente possível: Unhas que surgem durante a noite ("Unhas", de Ana Miranda); ondas que aparecem repentinamente e invadem a cidade ("A onda", de Adriano Espínola); a moça que tem gatos dentro de si ("A menina que tinha gatos dentro de si", Carmélia Aragão); uma cidade estranha, dominada pelos dragões, que remete a uma alegoria (que não se concretiza) da impossibilidade de se viver nas metrópoles atualmente ("Os quatro dragões azuis", de Dimas Carvalho); o jogo de dama ativo mesmo após anos da morte de seu dono, que o movimenta durante a noite, seguindo o ritual de quando estava vivo ("Jogo de Damas", de Pedro Salgueiro). No texto de Jorge Pieiro, "O bicado Oreblas", o que ocorre no sonho do personagem se torna realidade quando ele acorda, como se o mundo onírico e o real tivessem feito um pacto.

O insondável mistério da morte permite muitas experiências estéticas e inspira a criação de universos que transcendem a razão. No irônico "Pequeno interlúdio para o desespero", de Airton Monte, a personagem parece ter passado a vida a aprender a cozinhar para os seus familiares, pois, quando atinge o seu objetivo e os procura para se sentarem à mesa, todos viraram peças de pedra ou de cera; a descontinuidade do tempo permite que ela não o perceba. Em "Folhas Caídas", de Nilze Costa e Silva, a vida da personagem depende da vida da planta; quando o vegetal murcha, a moça sabe que é hora de partir. No conto de Silas Falcão, "O Celular", o protagonista, após retornar de um enterro, recebe a ligação da pessoa morta. Já em "O sobrevivente", de Tércia Montenegro, são "as nuvens ruins do céu" o elemento desencadeador de uma maldição.

O insólito
Acontecimentos inusitados se desdobram nos enredos, tornando possível o que parece absurdo. Nilto Maciel metamorfoseia um rosário na figura de um homem: (Texto II)

O conto de Glauco Sobreira, "Como sou por dentro", surpreende pela simplicidade com que os elementos narrativos, em poucas descrições, criam o efeito fantástico: o personagem tem uma ferida no tórax que o transforma numa ruína. Lembra a alegoria de "O homem do furo na mão", de Ignácio de Loyola Brandão, mas a expressão concisa do autor não permite encontrar, nem no final do texto, qualquer explicação racional para o fenômeno. Do mesmo modo, lembra uma alegoria do homem saturado pelo estresse da vida o enredo construído por Jesus Irajaci Costa, em "Avenida Treze", onde o advogado Jorge Vargas, atormentado por problemas domésticos, acorda num dia incomum e atinge o seu limite de tolerância ao ver-se preso num engarrafamento. Ele se transforma num gorila e, após deferir golpes nos automóveis parados na avenida, foge, incólume, para o mangue.

Se os fantasmas ´alvacentos e aterrorizantes´ eram os instauradores do insólito nos primeiros contos fantásticos, fazendo jus a uma era de crendices em visagens e espectros, no nosso tempo, o extranatural pode ser apenas a desagregação do real, e os motivos se atualizam para traduzir o medo de um novo tempo: uma planta, os pés inchados, um relógio, ou "humanoides planando sobre discos metálicos". São muitos os contistas cearenses que enveredam pelo insólito; alguns de modo mais tradicional, instaurando um clima desagregador e o medo; outros naturalizam o extranatural, trazem-no para a rotina do personagem sem a instauração do pavor, embora colocando o leitor diante de fatos que fogem, então, totalmente da lógica referencial.

Trechos
TEXTO I
"O ambiente agora era úmido e fétido. Verificou as palmas das mãos com olhos abismados. Mal podia acreditar. Teve visões difusas do seu inferno. Mas ainda não era hora de purgar a alma. Só quando voltou a si definitivamente é que foi recordando... aos poucos... E compreendeu, com assombro, que o pesadelo estava apenas começando".

TEXTO II
"O rosário não parava de se mover, arrastava-se pelo chão como um réptil, dando voltas ao redor da mesa e de nós. E só então compreendemos a verdadeira natureza das contas. Não, não se tratava de um rosário de contas, de um objeto, mas de um ser vivo". Raymundo Netto, no conto "Anúncio", cria um personagem que, no decorrer dos fatos, inquieta-se com os olhares e as atenções que atrai; só no final revela-se o mistério: "Foi ao banheiro, torceu para que a cunhada ali não estivesse, e encostou-se à pia. Foi então que teve a conclusiva revelação: ante ao armário do banheiro, percebeu que, ao invés de sua costumeira face, havia um espelho!".


ENSAIO

A casa enquanto abrigo para o insólito

Publicado em 17 de julho de 2011

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Na segunda parte da Coletânea, estão capítulos ilustrativos dos 17 romances fantásticos escritos por cearenses. O primeiro, A casa assombrada, de Bezerra de Menezes, traz a inserção do sobrenatural, a presença de barulhos estranhos e mesmo uma assombração corporificada, capaz de interagir com os vivos para horrorizá-los: de repente, foi a atenção de um e de outro atraída para a aparição de um terceiro, embuçado em um capote escocês, que se acocorou ao pé de Manoel e pôs sobre as brasas a sua espetada. Esta, em vez de ser de carne, era um sapo enorme, cuja gordura derretia-se e pingava nas brasas, que crepitavam sinistramente. Os dois olharam-se como quem dizia: temos obra. O intruso, mudo e impassível, virava o sapo, ora de barriga para cima, ora de costas, e, por fazer obséquio a quem lhe fornecera as brasas, levava-o acima da espetada vizinha para untá-la com a gordura que escorria do bicho. O Fantástico se realiza de forma tradicional, tanto pelo espaço, como pelo clima soturno que se estabelece, quanto pelo motivo que conduz o enredo.

Rodolfo Teófilo
Em O Reino de Kiato, de Rodolfo Teófilo, não há a presença de assombrações, mas tão somente de elementos que subvertem a normalidade, como a flor esquisita e curiosa, que Tinha corola de um sem número de pétalas azul ferrete, quase negro, como que brunidas, com reflexos metálicos, e no centro os órgãos de reprodução, alvos como arminho; engastava-se num pedúnculo curto, envolvida num ambiente delicado e sutil perfume bem como a uma crisálida, uma joia que resplendia aos raios do sol, vistas pelo dr. John King Paterson, ao chegar em Kiato, cidade que causava estranheza pela soberania da liberdade depois de mais de um século de reação contra os usos e costumes, frutos da intoxicação alcoólica e sifilítica.

Já A Rainha do Ignoto, de Emília Freitas, retoma o diálogo com os mortos, visto em A casa assombrada, configurando um fenômeno que ultrapassa o estranhamento, a mera anormalidade, e instaura a presença do sobrenatural, tal como ocorre também em O valete de espadas, de Gerardo Mello Mourão, por meio do casarão e de Gamaliel que figuram ao narrador como aparições diabólicas, modificando, inclusive, a sua visão sobre a anormalidade da amada Jezebel.

Os espaços
A casa assombrada, ou o casarão, ou simplesmente a casa, são espaços e motivos de várias narrativas presentes nesta Antologia. Na obra de Natércia Campos, a casa é a personagem protagonista e a narradora de fatos que atravessam gerações. Em o Mundo de Flora, de Ângela Gutiérrez, há um casarão onde se ouve a voz dos mortos; em Leão de Ouro, de Natalício Barroso, há até a observação: "não há casa antiga que não tenha seu fantasma", já que os mortos arrastam chinelos, desarrumam coisas e acendem velas.

Em Coração de Areia, de Marly Vasconcelos, também são os mortos os autores dos fenômenos, pois se manifestam e exercem influência na vida dos vivos através dos seus retratos. No enredo de Busca, romance do professor Teoberto Landim, igualmente há uma casa mal-assombrada, onde, durante a noite, estilhaçam-se garrafas no chão. Seja com um leitmotiv futurista, como disco-voador; inusitado, como cabeças de deuses que dão orientações para a vida; ou tradicional como a visão de almas, o ouvir de vozes, a petrificação de uma moça durante a missa ou o revoar de morcegos presos em gaiolas, aparição de serpentes ou abutres, transformando o clima de toda uma região, as narrativas se constroem por meio de fenômenos inexplicáveis pelas leis da razão.

Loucura e maldição
Em Os verdes abutres da colina, de José Alcides Pinto, loucura e maldição se fundem, criando um universo completamente surreal. A lógica dos fatos é subvertida pela presença de uma maldição em todo o Alto dos Angicos, região fundada pelo coronel Antônio José Nunes, o garanhão luso que naufragou naquelas terras e a povoou unindo-se a uma índia. Ele multiplica a população ao relacionar-se com várias mulheres ao mesmo tempo, inclusive com suas filhas; assim, seus netos são também seus filhos. Os verdes abutres anunciam o fim de tudo, transformam toda a atmosfera, mesmo com a crença do povo no poder do demônio preso numa garrafa.

Não necessariamente o evento instaurador do insólito percorrerá toda a obra romanesca; desde que encenado, em qualquer passagem, dará a ela a caracterização do gênero de que ora tratamos, o que não negará, se existente, a presença do estranho, do maravilhoso, do macabro ou do surreal.

Quanto aos poemas, os teóricos do gênero não citaram, em nenhum de seus estudos, peças para ilustrar características do Fantástico, tão somente mostraram a sua configuração em composições narrativas como o conto e o romance. A despeito dessa desconsideração pela presença do gênero em versos, um dos primeiros textos que incorporaram elementos como gigantes, deuses e intervenções sobrenaturais na literatura foi o "Poema de Gilgamesh", composição suméria do 2000 a. C, a que se seguiram a epopeias a Ilíada e a Odisseia, de Homero, todos, como é natural do épico, versos narrativos com forte inserção do extranatural. Já na Idade Média, apareceu, na Índia, o Mahábharata, poema que narra acontecimentos históricos que têm, nitidamente, a intervenção do mitológico. Especificamente no Ceará, tais manifestações se deram, inicialmente, na poesia do patriarca Juvenal Galeno, do poeta Barbosa de Freitas, dos romancistas Bezerra de Menezes, Rodolfo Teófilo e Emília de Freitas, bem como em contos e poemas de Antônio Sales, percorrendo as correntes estéticas que se seguiram e se sobressaindo, então, em gêneros textuais variados.

A voz lírica
Tomando o Fantástico na acepção de fantasia ou encenação de evento transgressor da normalidade, os organizadores decidiram incluir nesta coletânea poemas que transparecem imaginações delirantes ou evocam criaturas que subvertem fatos naturais, como bruxas, duendes, gnomos, feiticeiras, morcegos, sereias, satanás. Compreendendo-o, em sua concepção primeira, como instauradores do mal, os versos são abundantes em palavras como: treva, morte fúnebre, lúgubre, sombrio, tormento, fantasma, mistério, vulto, pântano, assombração, medo, maldição, alma, soturno, visagem, espectro, pavor, horror, presságio, todas pertencentes a um campo semântico muito semelhante. O ponto alto da seleção está nos poemas narrativos, dos quais se podem destacar Excertos de Brosogó, Militão e o Diabo, de Patativa do Assaré, em que Brosogó acende vela para o diabo e o encontra, na vida real, como seu defensor; em O vestido que verteu sangue, de Oswald Barroso, conta-se a história de Maria Sinhá, cujo vestido verteu sangue, como anuncia o título, Saiona, a mulher dos olhos de fogo, de Rouxinol do Rinaré, cujo título já anuncia a desordem do real.

Considerações finais
Seja no conto, seja no romance ou nos versos, os fenômenos sobrenaturais e o insólito são fontes de inspiração perene para os escritores cearenses. A desagregação da lógica, a subversão da normalidade, se dá, sobretudo, pelo insondável mistério da morte, que predispõe a inquietação e a inventividade dos que sondam seu enigma. A metamorfose, a aparição dos mortos, a presença de seres sobrenaturais ou providos de poderes inusitados colocam o leitor diante de um universo em que absolutamente tudo é possível. Com essa amostra, tão bem selecionada pelos organizadores da antologia, vê-se que o gênero fantástico permanece, embora com seus cânones revisados, e que a produção da nossa literatura está em constante busca do universal; ultrapassou, há muito, as fronteiras do regional e pode se afirmar, qualitativamente, em qualquer contexto.

Saiba mais
BARTHES, Roland. O prazer do texto. São Paulo: Perspectiva, 1993

DIMAS, Antônio. Espaço e romance. São Paulo: Ática, 1986

MESQUITA, S. Nahid de. O enredo. São Paulo: Ática, 1986

PARDAL, Paulo de Tarso.Discurso do imaginário. Fortaleza: Livro Técnico, 2003

SCHMITT, Jean-Claude. Os vivos e os mortos na sociedade medieval. São Paulo: Cia das Letras, 1999